quinta-feira, 17 de maio de 2012

OFICINA DE LEITURA E PRODUÇÃO TEXTUAL

O Que é ler?
Para que ler?
Como ler?

Na qualidade de leitores ativos, estabelecemos relações entre nossos conhecimentos anteriormente constituídos e as novas informações contidas no texto, fazemos inferências, comparações, formulamos perguntas relacionadas com o seu conteúdo. Mais ainda: processamos, criticamos, contrastamos e avaliamos as informações que nos são apresentadas, produzindo sentido para o que lemos. Em outras palavras, agimos estrategicamente, o que nos permite dirigir e auto-regular nosso próprio processo de leitura.





 A pluralidade de leituras e de sentidos pode ser maior ou menor dependendo, por um lado, do texto, do modo como foi constituído, do que foi explicitamente revelado, e do que foi implicitamente sugerido; por outro lado, da ativação, por parte do leitor, de conhecimentos de natureza vária, bem como de seus objetivos e de sua atitude perante o texto.


 

  
 Assim, considerar o leitor e seus conhecimentos e que esses conhecimentos são diferentes de um leitor para outro implica, necessariamente, aceitar uma pluralidade de leituras e de sentidos em relação a um mesmo texto.

  
PASSEIO NOTURNO


Cheguei em casa carregando a pasta cheira de papéis, relatório, estudos, pesquisas, contratos. Minha mulher jogando paciência na cama, um copo de uísque na cabeceira, disse sem tirar os olhos das cartas, você está com um ar cansado. Os sons da casa: minha filha no quarto dela treinando impostação de voz, a música quadrifônica do quarto do meu filho. Você não vai largar essa mala?, perguntou minha mulher, tira essa roupa, bebe um uisquinho, você precisa aprender a relaxar.
Fui para a biblioteca, lugar da casa onde gostava de ficar isolado, e como sempre não fiz nada. Abri o volume de pesquisa sobre a mesa, não via as letras e números, eu esperava apenas. Você não pára de trabalhar, aposto que os teus sócios não trabalham nem a metade e ganham a mesma coisa , entrou a minha mulher na sala com o copo na mão, já posso mandar servir o jantar?
A copeira servia à francesa, meus filhos tinham crescido, eu e minha mulher estávamos gordos. É aquele vinho que você gosta, ela estalou a língua com prazer. Meu filho me pediu dinheiro quando estávamos no cafezinho, minha filha me pediu dinheiro na hora do licor. Minha mulher nada pediu, nós tínhamos conta bancária conjunta. Vamos dar uma volta de carro?, convidei.
Eu sabia que ela não ia, era hora da novela. Não sei que graça acha passear de carro todas as noites, também aquele carro custou uma fortuna, tem que ser usado, eu é que cada vez me apego menos aos bens materiais, minha mulher respondeu.
Os carros dos meninos bloqueavam a porta da garagem, impedindo que eu tirasse o meu. Tirei os carros dos dois, botei na rua, tirei o meu, botei na rua, coloquei os dois carros novamente na garagem, fechei a porta, essas manobras todas me deixavam levemente irritado, mas ao ver os pára-choques salientes do meu carro, o reforço especial duplo de aço cromado, senti meu coração bater apressado de euforia. Enfiei a chave na ignição, era um motor poderoso que gerava sua força em silêncio, escondido no capô aerodinâmico.
Saí, como sempre sem saber para onde ir, tinha que ser uma rua deserta, nesta cidade que tem mais gente que moscas. Na avenida Brasil, ali não podia ser, muito movimento. Cheguei numa rua mal iluminada, cheias de árvores escuras,  o lugar ideal. Homem ou mulher? Realmente não fazia grande diferença, mas não aparecia ninguém em condições, comecei a ficar tenso, isso sempre acontecia, eu até gostava, o alívio era maior.
Então vi a mulher, podia ser ela, ainda que mulher fosse menos emocionante, por ser mais fácil. Ela caminhava apressadamente, carregando um embrulho de papel ordinário, coisas de padaria ou de quitanda, estava de saia e blusa, andava depressa, havia árvores na calçada, de vinte em vinte metros, um interessante problema a exigir uma grande dose de perícia.
Apaguei as luzes do carro e acelerei. Ela só percebeu que eu ia para cima dela quando ouviu o som da borracha dos pneus batendo no meio fio. Parei na árvore à frente, peguei o pacote no banco detrás e acelerei novamente. Pelo retrovisor vi quando a mulher abriu o pacote.
A mulher soltou um sorriso e levantou as mãos para o céu. Quando cheguei em casa a família estava vendo televisão. Deu sua voltinha, agora está mais calmo?, perguntou minha mulher, deitada no sofá, olhando fixamente para o vídeo. Vou dormir, boa noite a todos, respondi, amanhã vou ter um dia terrível na companhia.

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